Fórum Brasil Export abre espaço para discussão sobre o marco regulatório do transporte ferroviário e maior participação na matriz de transporte de carga. O diretor presidente da ABOL – Associação Brasileira de Operadores Logísticos e conselheiro do Brasil Export, Cesar Meireles, participou do evento
As ferrovias e as mudanças no marco regulatório do transporte ferroviário, bem como o desafio de uma maior participação na matriz de transporte de carga, estiveram como temas centrais da pauta de discussão em um webinar organizado pelo Fórum Brasil Export, que reuniu especialistas, empresários e autoridades públicas na última semana.
O evento trouxe como palestrantes o presidente da ANUT (Associação Nacional dos Usuários de Transportes), Luiz Henrique Baldez; o secretário-geral da ALAF (Associação Latino-Americana de Ferrovias/Brasil) e conselheiro do grupo Itapemirim, Jean Carlos Pejo, e o diretor da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), Alexandre Porto. O encontro foi mediado pelo conselheiro do Brasil Export e relações institucionais da FGV Transportes, Rodrigo Vilaça.
“Esta discussão tem extrema relevância porque podemos constatar uma ação inequívoca a favor de pontos muito importantes para o setor, como desburocratização e regulamentação mais moderna, entre tantos outros esforços”, avaliou Vilaça. “Posso testemunhar os avanços no modal, seja do ponto de vista do concessionário, do usuário ou do cliente, com novas alternativas de serviços mais sofisticados e atrativos. Indiscutível também o progresso na abordagem da intermodalidade. Precisamos reconhecer esse empenho na criação de um marco regulatório que está gerando confiança e delineando condições para a sua concretização por engajadores de projetos de médio e longo prazo”, continuou.
Durante o webinar, questões nevrálgicas para o setor foram colocadas em discussão, como aumento da oferta de capacidade, direito de passagem, precificação de tarifas e criação de ambientes convidativos e seguros para os investimentos privados.
Falando pelos usuários, Baldez, da ANUT, apresentou na discussão a realidade dos trechos abandonados ou subutilizados, que hoje somam quase 60% da malha ferroviária. “A caducidade e a relicitação das malhas significam para nós redução na oferta de capacidade, o que muitas vezes empurra a operação para o modal rodoviário. Chegamos a enviar ao Ministério da Infraestrutura um ofício no qual solicitamos a instituição de um programa para recuperar esses trechos, de modo que viabilizem uma oferta adicional de capacidade”, disse.
Outra preocupação mencionada por Baldez diz respeito ao sistema ferroviário do porto de Santos. “Já nos posicionamos favoravelmente à mudança do modelo – de preferência na versão open access -, para que se democratize a chegada ao porto santista. Mantemos nosso foco em aumento de capacidade e melhoria de tarifa por intermédio do acirramento competitivo. Quanto mais intensa a competição modal e intermodal, mais benefícios terão os usuários e também a sociedade brasileira. É premente a necessidade de destravar os monopólios”, opinou.
Short Lines
Como explicou Pejo, da ALAF, o modelo de exploração da ferrovia no Brasil voltou-se para grandes volumes em distâncias razoavelmente longas. Consequentemente, gera-se forte concentração no transporte de commodities agrícolas e minerais, em um “modelo que vem se mostrando muito eficiente para esse tipo de carga”. Ele, porém, sinaliza: “É preciso encontrar novas soluções para, por exemplo, a produção industrial e a carga geral, cenário em que ganham relevância as short lines – pequenas ferrovias a operar em ramais secundários -, com possibilidade de utilização dos mais de 7 mil quilômetros de linhas hoje subutilizadas. As short lines podem revelar-se extremamente úteis tanto no reaproveitamento de linhas existentes quanto no desenvolvimento de novos projetos idealizados para esse tipo de modalidade”, sugeriu.
Na visão de Pejo, há grande potencial para as short lines. “Os fluxos do transporte não ocorrem apenas no sentido da exportação; existem intensas movimentações regionais que poderiam incluir a ferrovia como opção modal”.
Outra questão levantada pelo secretário-geral da ALAF refere-se à multimodalidade. Ele citou exemplos na América do Sul, como a combinação da cabotagem com a ferrovia verificada no Chile. “No Brasil temos um potencial realmente grande de cabotagem e a opção de investimentos cruzados (trechos de ferrovias construídos pela iniciativa privada sem custos para o governo), o que pode funcionar como uma alternativa para novas conexões no escoamento. Os investimentos cruzados revelam-se, portanto, uma forma muito interessante de viabilizar novos projetos. Não podemos, porém, deixar de mencionar uma questão que fragiliza muito a multimodalidade: a bitributação. Já que estamos em meio à renovação das concessões, com a possibilidade de incluir short lines em projetos greenfield e brownfield, e também já que existe o Projeto de Lei do Senado n.° 261/2018, de autoria do senador José Serra (PSDB/SP), sobre autorização e autorregulação ferroviária, com interferência na questão regulatória, este também se mostra o momento adequado para discutir uma alternativa no campo da tributação”.
Presente ao evento, o diretor presidente da ABOL – Associação Brasileira de Operadores Logísticos e conselheiro do Brasil Export, Cesar Meireles, recebeu a palavra do moderador, aproveitando para exemplificar o avanço do modal ferroviário rumo ao ganho de eficiência, no que concerne ao uso cada vez mais crescente do contêiner na ferrovia, pela associada da ABOL, a Brado Logística. “Queria trazer aqui os ganhos da Brado Logística, nossa associada, que vêm contribuindo, sobremaneira, para a competitividade do produto transportado, bem assim, ensejando e fortalecendo o conceito do uso da multimodalidade. A introdução do contêiner double stack e também da unidade de 53 pés, já em fase de testes, traduziu-se em uma vantagem operacional competitiva muito importante. Na comparação com o contêiner padrão, o double stack permite ganho de 34% em volume, e o de 53 pés, de 21% em relação ao de 40 pés, igualmente em relação ao volume de carga transportada. Adicionalmente, tais equipamentos se aplicam plenamente à integração com o modal rodoviário, incentivando a multimodalidade. Trata-se, portanto, de avanços que precisam ser anotados e levados em consideração”.
Meireles fez coro com o secretário-geral da ALAF e enfatizou a importância da reforma tributária no que tange à multimodalidade. “Sem reforma tributária a instituir um imposto único, é melhor retirar a multimodalidade da agenda de discussões de todos. O assunto da logística fiscal e tributária tem extrema importância e exige um tratamento não apenas sério, mas também urgente”, disse.
Intenso Esforço
“Houve um esforço muito intenso da agência e do governo em preparar um ambiente regulatório para receber o investimento privado, com a desburocratização dos processos e o aumento da segurança jurídica”, disse o diretor da ANTT.
Segundo Porto, desde 2017, com a elaboração do marco regulatório, a agência vem se dedicando a desenvolver modelos de contratos com uma arquitetura de regras modernas e ágeis, matriz de riscos, novos mecanismos de reequilíbrio (definidos nos modelos de contrato), regras de reinvestimento baseadas em parâmetros mais bem detalhados (de modo a ensejar uma avaliação mais precisa de indicadores de desempenho da prestação do serviço), cláusulas de arbitragem para resolução de conflitos e outros recursos técnicos a tornar o modelo mais seguro e previsível para o investidor privado.
“Tivemos grandes conquistas no setor, como a licitação da ferrovia Norte-Sul, a malha paulista e prorrogações antecipadas das malhas da Vale, o que consolida o novo marco regulatório para os próximos 30 anos. Temos ainda muito pela frente: a licitação da Ferrovia de Integração Oeste-Leste (FIOL), o projeto Ferrogrão e as renovações antecipadas da MRS e da Ferrovia Centro-Atlântica (FCA), entre outras iniciativas”, afirmou.
O diretor da ANTT abordou também no webinar organizado pelo Fórum Brasil Export temas relativos a operadores ferroviários independentes (OFI), compartilhamento e direito de passagem, oferta de capacidade e tarifas. “Estamos trabalhando em uma nova resolução que busca atribuir ao operador ferroviário independente o mesmo direito de passagem de todos os demais, em um ambiente de livre negociação entre as partes, no qual a agência fica com a responsabilidade de mediar conflitos comerciais ou operacionais que eventualmente possam surgir entre esses operadores”, explicou.
Porto comentou ainda que foi desenvolvida uma nova regra de compartilhamento nos novos contratos de concessão, especificando garantia de acesso a outros operadores do sistema e obrigatoriedade de remoção das barreiras técnicas para tal. O diretor da ANTT explicou outra regra criada: o primeiro a entrar na linha deverá ser também o primeiro a sair. Essa dinâmica, assim como todas as novas regulamentações, estará sob estrita fiscalização da agência, que criou um sistema de supervisão nacional de ações para controlar o despacho de trens.
Capacidade Garantida
“No contrato estão incluídos modelos que condicionam a concessionária a investir em expansão para garantir a capacidade em trechos com demanda muito acentuada. Nos casos de maior densidade de tráfego, criamos uma ferramenta que funciona como gatilho de investimento. Quando a ferrovia atinge certo nível de saturação, a concessionária fica obrigada a investir em ampliação de capacidade. Também definimos um teto tarifário para o direito de passagem”, disse Porto.
Com relação ao Projeto de Lei do Senado n° 261/2018, o diretor da ANTT elogiou o caráter inovador e ousado do projeto. “É considerada a questão da autorregulação para o setor, que muito tem a ver com os trechos abandonados. Seria possível autorizar a venda de trechos abandonados pelos quais a iniciativa privada demonstra interesse”, concluiu.
Assessoria de Imprensa
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Fonte: cargonews.com.br